CENA 2 – Um fim e meio

Diálogos: ou como conversar com o artelo

INTERIOR DE UM CASTELO, NA SALA DO TRONO. O REI ESTÁ SENTADO NO TRONO QUANDO UM CAVALEIRO ENTRA ABRUPTAMENTE COM A CABEÇA DE UM LEÃO EM UMA DAS MÃOS.

CAVALEIRO (ao jogar a cabeça do leão aos pés do rei): Aí está! Matei a criatura que assolava o reino. Provei mais uma vez que sou digno da mão da princesa.

REI: Parabéns, bravo guerreiro! Sua coragem e destreza são ímpares em todo o reino. Um homem digno, no entanto, é capaz de usar suas mãos tanto para curar quanto para ferir. Nossos súditos têm sofrido com uma praga que desafia até o mais sábio dos alquimistas. Após muito pesquisar, meus conselheiros descobriram que as frutas da árvore dourada, no jardim proibido, podem curar qualquer…

CAVALEIRO: Não me faça de tolo!

REI: Não sei do que você…

CAVALEIRO: Desafios, missões impossíveis, tarefas mortais! Não importa quantas proezas eu realize, sempre sou recebido com mais ordens para matar isso, salvar aquilo, recuperar aquilo outro… Você me quer morto!

REI: Isso não é verdade!

CAVALEIRO: Você espera que eu encontre minha morte nas garras de um mostro ou outro perigo qualquer, por isso inventa demandas que me levem a um destino fatal. Saiba que minha determinação é mais forte do que a minha espada! A princesa é a única mulher que eu considero digna neste mundo e, por ela, eu sempre retornarei. Não importa quantos perigos você invoque, eu sempre voltarei triunfante e mais decido do antes. Retornarei para a princesa! Sempre!

REI: Sempre?

CAVALEIRO: Sempre!

REI: Excelente! Nunca duvidei da sua destreza. Se minhas demandas foram muitas, é porque eu confiava na sua capacidade para superá-las. Não há em todo reino um cavaleiro mais corajoso e forte do que você. Eu temia que a morte da princesa significasse a fim da sua determinação. Mas vejo que não é o caso. Agora percebo que você sempre honrará a vontade que sua amada tinha em vida.

CAVALEIRO: Do que você está falando? Morte?!

REI: A princesa amava o reino e seu súditos. Por ela, por eles, todas as tarefas que você realizar não serão em vão!

CAVALEIRO: A princesa está morta?!

REI: Há meses, mas mesmo no túmulo ela continuará a lhe inspirar! Você mesmo disse! Ela era a única mulher digna de seu amor, a estrela guia da sua coragem, e continuará sendo.

CAVALEIRO: Meses?!

O CAVALEIRO DESEMBAINHA SUA ESPADA E ATRAVESSA O REI COM A LÂMINA.

CAVALEIRO: Maldito! Você mentiu para mim!

REI (caído no chão, sangrando): Foi pelo bem de todos… Você disse que faria tudo por ela… Pense em todas as vidas que você salvou em nome da princesa.

CAVALEIRO: O que me importa a vida dos outros? Se eu não posso ter a princesa, então os outros que se danem! Pro inferno com as suas mentiras!

REI: Foi pelo bem de todos… Achei que você entenderia…

O REI EXALA SEU ÚLTIMO SUSPIRO E MORRE.

FIM DE CENA

 


Esse texto faz parte da série “Diálogos: ou como conversar com o martelo”. Uma série de cenas curtas inspiradas em obras de filosofia. Não são explicações de conceitos. São meramente personagens gritando, conversando e sussurrando sobre os mesmos assuntos que os filósofos famosos.

Foto de capa de Pexels

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